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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Chamar-me-ão de trapaceira? Hei de emitir um antigo.

(12/10/2010 - 19:43 - Matéria)
      Cabeça: lateja do vazio da matéria. Matéria essa limitada por três dimensões terrenas a restringirem a energia potencial de um corpo inerte. Sendo o ato materialização da potência, restrita pela matéria, constituinte do ato, nada se efetivamente tem que não paredes integrantes da tumba frígida em que está contida, em toda a futilidade material, a (im)potência. Morta, dói a cabeça ciente da condenação eterna à cela tridimensional que abriga os átomos, partes menores das moléculas, partes menores das substâncias, das quais advêm todos os atos, contínuos, dispostos em círculos, limítrofes e fúteis, frios, fúnebres. 
   Corpo: peso desnecessário, atrelado à cabeça, conjunto de aglomerados moleculares dúbios e desamparados, dado o imaginável número correspondente a todas as poucas possibilidades de movimentação dentro da tumba infeliz que prende os desejos à matéria. Punição última aos prepotentes pensamentos (falsamente) livres; pensam que detêm a aptidão de vagarem selvagens pelos campos, há de se lhes avisar que a liberdade é utópica e nada é de fato potencialmente livre - a potência é retida pelos atos. Em última instância, tem-se que o corpo é o mais propício veículo a viabilizar a materialização da raiva de estarmos todos mortos dentro de um espaço diminuto e sem nenhuma esperança de libertação; é ele que permite a quaisquer almas inconsoláveis o extravasamento da fúria e do ódio ao mundano - basta usufruir das funções musculares para bater com a cabeça na parede e fazê-la latejar mais, mais vazia, mais limitada e mais podre (como a matéria).



(20:17 - Vácuo)
        À parte das três dimensões, latente no plano da Terra, existe uma porção de nada, que corrói a empatia das ideias com a cabeça, e que destrói a vitalidade da mente suprimida pelas paredes do cárcere. Não há felicidade disponível aos que tomam desgosto pelo simplório, o efetivo ponto de partida que origina o campo onde se abrigam pobres os corpos. Inútil é, de fato, a existência dentro de um globo cercado por muros. 
     Não há, ainda, motivações óbvias para atingir em triunfo o final de um dia e o início do próximo, respirando pacientemente, até que não mais seja viável ao organismo seguir tal rotina. Seja o não-óbvio causa última da paciência, não-óbvio encontrado no esquecimento de que o real é finito e a vida limitada. Afortunados, pois, os que gozam do aproveitamento máximo dos dias em série antecedentes do não-ser. Afortunados os entes em constante ou transitório estado de sublime, proveniente da fusão de cabeças, e, em consequência, de corpos. Duas cabeças fundidas implicam duas tumbas convertidas em uma apenas, portanto de maior interior, maior potência e maior pseudo-liberdade. 
     Desafortunado o que não somente não se funde, como detém extrema incapacidade de fingimento, necessário ao não-sofrimento diante da assertiva incontestável de que é afinal verdade, tudo é fútil e simplório - não mais que isso. A salvação é o estofamento do nada com cabeças, mentes e corpos, depressa, antes que a latente falta de matéria corroa por inteiro as esperanças de preencher os vazios e ocupe até a borda as três dimensões, transformando o outrora ente em um irreparável buraco negro - e mais nada.



(20:59 - Salve-me)
      Considerando o tempo, ilimitado, como a quarta dimensão, à qual são subordinadas as outras três em sua consistência, evidente que ele é a base-controle responsável pela sucção de toda a liberdade. O ilimitado pois limita, e corre, passa voraz e puxa consigo as existências, cada qual segmento de reta da reta-suporte, infinita, livre. Conforme envelhece o segmento, aumenta o vazio, cresce o buraco, ascende o nada, e as células-vivas morrem, uma a uma, explodem, explodem a cabeça e o corpo e toda a vitalidade, explode a energia potencial e o último suspiro de desejo ávido por supressão dos lapsos doloridos de consciência de que a mente - é inevitável - lateja de futilidade. 
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Apple, 12/10/2010 - ainda sugada pelo sublime Vácuo

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Adeus

Nota: embora não seja, mais uma vez, de todo memorável, as circunstâncias o tornam não apenas confortante, mas também necessário ao confronto face a face com a dor da perda. Detivesse eu a certeza de que um texto pudesse servir de meio de comunicação com os já falecidos, dedicá-lo-ia a meu avô, para sempre ausente, do dia de sua morte em diante.
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Compreendo que estejas triste,
Que o tempo te caia pesado,
E a luz que brilhou, no passado,
Apague a quem mais não existe.

Resiste, porém, tem coragem;
Não deixes o tempo parado.
Se não mais estou do teu lado,
Eis que ainda vivo em imagem.

Miragem posso ser, ao vento,
Se prometes manter segredo
Quanto a esta presença implausível.

Incabível é, e lamento
Por te ter deixado (com medo),
A permanência no tangível.

- E não derrames mais lágrimas 
Ao que não é reversível.

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(Heartbroken) Apple, 06-07/09/2011 - 01:21

Éden

Nota: tentei avidamente, mas deste não consegui gostar muito, decerto não é nenhuma obra-prima. Ainda assim, entretanto, cumpre ao propósito e diz a que veio. Leia-se: válido.
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Quão suscetível a mente
À arte da sedução!
Proíbes-me a dizer não,
Desde que ao corpo me esquente.

Quão audaz, dúbia, demente
Conversão a subalterno!
Ando na estrada do Inferno
(Abismo teu, tão somente).

E o corpo, não ele mente
Em cárcere, confinado
Às sombras, por mais tentado
Que à cobra esteja? 
- Demente!

Que és cruel e indolente,
Já a isso aderi. 
- Blasfêmia!
Mas quão inocente a fêmea...
Quão venenosa a semente!

Peco, e que a tanto me tente
A Cobra, a anfitriã
Dos prazeres da maçã
Rubra, sensual, ardente.

E se o Divino pressente
O êxtase condenável,
Condene-me à formidável
Vida no lar da Serpente.

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Apple, 06-07/09/2011 - 01:03

domingo, 4 de setembro de 2011

Eros



No âmago da epiderme, 
É vício que tenho em mim.
Desejo esse frasco inerme,
Embebido em líquido,
Ostentando a droga, sim
- A droga do leite insípido.

Em lábios, droga-me, então,
E que seja só o início.
Qual tremendo desperdício
É manter o corpo são!
Espalha-te pelo torso;
Em espasmos me contorço
E condenso a podridão.

Peças que pedires, mestre,
Ah, obedecer-te-ei!
Reavivo as pernas mortas,
Transporto-te ao não-terrestre,
Cerra tudo. Abro as portas.
Ordena-me: eu o farei.

Que as glândulas salivares
Me deem cura ao veneno,
Embebedem-me ao extremo,
Sejam espetaculares
Agrados aos cães famintos.
Se pérola inoculares,
Animalescos instintos
Hão de emergir do terreno,
De outra vez intactos ares.
- Outra vez virgem e pleno.
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Apple, 04/09/2011- 23:16

Regênese


Quem és tu bebendo no copo a
Transbordar de nada, e em nada
Sugando a fonte já esgotada,
Como a quem se diz força inócua

Quem és tu, ente invasor, nem
Te atrevas, em meu território,
A gozar do campo ilusório
Do vazio de meu desdém

Porém, micróbio intruso, dou-te
Por esta nova peça crédito,
Quão louvável me é a escrita!

Ainda sem teu nome, sou-te
Grata à nova prole do inédito,
Que o nada já substância habita

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Apple, 04/09/2011

Horas

II - Abismo em noite do dia primeiro de inverno


Bate o sino sob a luz da noite.
Tornasse o tempo, tácito, à trás
Da sombra-tez do remorso. Foi-te
A chance prima: não voltarás.  


Se tudo aos ventos, não mais importa
Quão errôneo foi teu julgamento.
E, se tornado vem do teu vento,
Que te admira o teu pranto à morta?


À tua culpa, não dela cansas?
Juízo mau não é teu ofício?
Eis que o passado só são lembranças.
E o equinócio já é solstício.


À tua pena? Não temas nada!
Eis que o relógio não para mais.
Os ponteiros não volvem à trás
Do tempo à morta despedaçada.

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I - Queda em manhã do dia último de outono


Martelos clamam ao inefável
Prelúdio, este ao silenciar
Da Consciência. Quem julgará 
A selva em furor incontrolável?


Não mais o tempo me prende ao plano,
Até onde reina a escolha certa?
Se as tripas rasgo, de boca aberta,
Sou eu o monstro - não ser humano.


Possuo a ti, enfim. Reduzi-la 
A Carne pútrida destruída, à
Tortura abissal que à Besta instiga.
Rende-te à garra que te mutila.


Agora és verme, ou, em desacato, o
Bolor grotesco de um poço em sangue do
Que a mim impera: o demônio lânguido
Que, em sussurros, selou-me o ato.

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Apple, 04/09/2011